quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Henrique Monteiro em resposta a Ricardo Costa : Sobre a importância do 1 de Dezembro e sua celebração

Hoje sou eu a criticar Ricardo Costa
Mas o Ricardo não tem razão. É uma coisa que lhe acontece (como a todos) de vez em quando. Não tem por dois motivos:


"Não devemos brincar com datas históricas, fundamentais à identidade nacional, como se isso só dissesse a respeito aos que agora cruzam a pátria". A frase é bonita e foi ontem escrita pelo diretor deste jornal para criticar um texto meu. Aposto que muitos leitores acham que fazemos de propósito para atrair audiências, mas não. Apesar de sermos amigos, não combinámos.
1)      O Governo não extinguiu o feriado do 1º de Dezembro por nada de especial, mas apenas porque alguém meteu na cabeça da troika que era preciso extinguir feriados. Dois religiosos e dois civis. Civis só havia à mão o 25 de Abril, o 1º de Maio, o 10 de Junho, o 5 de Outubro e o 1º de Dezembro. Como não podia acabar com o dia da Liberdade nem com o do Trabalhador; como o 10 de Junho fora recuperado como dia de Portugal (a substituir o da padroeira, Imaculada Conceição, Rainha de Portugal, dia 8 de Dezembro que era celebrado desde 1646); tendo-se-lhe ainda juntado o dia de Camões e das Comunidades, baseado numa semi-lenda, a da morte de Camões, nesse dia, em 1580, pouco antes de Portugal passar a ter Filipe II de Espanha como rei, extinguiram-se os dois restantes - República e Restauração. Mas pensar, ou sequer insinuar, que o Governo andou às voltas com problemas de identidade nacional é conferir-lhe um pensamento sobre algo que por aqueles lados não existe;
2)      O 1º de Dezembro, como tentei relatar, é uma construção feita mais ou menos há 150 anos e não fundamental à nossa identidade. O 24 de Julho (data do desembarque dos liberais em Lisboa) ou o fim do cerco miguelista ao Porto, em agosto do mesmo ano, seriam mais importantes. Para não falar do 11 de Novembro (feriado em quase toda a Europa) quando terminou a I Grande Guerra; ou mesmo o 9 de Abril, data da batalha de La Lys em que perdemos tantos soldados. Estas são datas reais de heroísmo popular e não construções "à medida" de quem delas se quer aproveitar.
Vamos agora à parte em que Ricardo Costa tem razão. A maioria dos feriados "assenta muito mais numa representação construída (à medida de quem serve e, naturalmente, o celebra ou simplesmente goza)". Por isso mesmo o 1º de Dezembro foi sempre à medida de ultra-nacionalistas e era o feriado mais reacionário do nosso calendário civil. Se fosse eu a mandar, também não o extinguia (porque não são mais três ou quatro feriados que provocam a nossa baixa produtividade), mas sinceramente não me ponho a chorar por se deixar de comemorar a data. Mas isto, claro, são diferenças entre quem teve de aguentar os tempos antes do 25 de Abril e quem só já viveu depois, como o Ricardo.


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